Até domingo, presidentes de Conferências Episcopais de todo o mundo estarão reunidos no Vaticano para o encontro convocado pelo papa Francisco sobre “A proteção dos menores na Igreja”.
Na abertura, na quinta-feira (21), o papa afirmou o seu forte desejo de responsabilidade em interpelar Patriarcas, Cardeais, Arcebispos, Bispos, Superiores Religiosos e Responsáveis “diante da chaga dos abusos sexuais perpetrados por homens da Igreja em detrimento dos menores”. Todos juntos e “com a docilidade” da condução do Espírito Santo, “escutemos o grito dos pequenos que pedem justiça”.
A proteção me menores é uma chaga que a Igreja enfrenta e não é de hoje. Diante dessa realidade, em dezembro de 2013, o Santo Padre instituiu a Pontifícia Comissão para a Tutela dos Menores, que nasceu com a missão de propor iniciativas para proteger os menores e os adultos vulneráveis, garantir que esses tipos de crime, na esfera civil e canônica, não sejam mais repetidos na Igreja.
A comissão presidida pelo arcebispo de Boston (EUA), cardeal O’Malley, trabalha com três finalidades principais: a escuta das vítimas, elaboração de diretrizes para o enfrentamento dos casos e prevenção nos seminários do mundo inteiro e a ideia é atuar como órgão consultivo do Santo Padre para a proteção de menores vulneráveis.
Os integrantes da comissão são bem diversos e de várias origens, leigos, religiosos e clérigos. Ao todo, são oito homens e oito mulheres escolhidos pelo Papa por sua competência e experiência. Um dos nomeados é o brasileiro Nelson Giovanelli Rosendo dos Santos, co-fundador da Fazenda da Esperança, comunidade terapêutica com mais de 30 anos de experiência na recuperação de jovens dependentes químicos e presente em 15 países do Ocidente ao Oriente.
Fazem parte da comissão também vítimas que sofreram abusos sexuais por parte de membros do clero. Segundo a comissão, como é de praxe, elas mantêm o direito de não revelar publicamente suas experiências.
Em 2017, a comissão começou a ouvir vítimas e familiares de quem passou por experiências de abuso. De acordo como vaticano, nos últimos quatro anos, a PCTM trabalhou com quase 200 dioceses e comunidades religiosas de todo o mundo para incrementar a conscientização sobre o crime dos abusos e educar as pessoas para a necessidade de tutelar casas, paróquias, escolas, hospitais e outras instituições.
No Brasil, está sendo implementado um projeto-piloto de proteção aos menores. O projeto está em fase de implementação na Fazenda da Esperança. O Vatican News, entrevistou o único representante brasileiro na Comissão Pontifícia, Nelson Giovanelli Rosendo dos Santos.
Como vai funcionar o projeto?
Este projeto é um grupo formado de sete a oito pessoas, que vai servir de subsídio para a CNBB, de apoio. Por ser composto justamente por vítimas, elas por experiência sabem explicar, propor, como pode ser evitado. É um grupo que agora no Brasil estamos na fase de implementação da identificação dos membros. Não é um grupo de autoajuda, é um grupo de pessoas que estaria à disposição, em particular da CNBB, para poder ajudar neste processo que o Papa Francisco está levando à frente no sentido do enfrentamento desta problemática.
Como o senhor analisa o modo como a Igreja no Brasil tem enfrentado esta questão?
É um processo novo aqui no Brasil. E aquilo que está acontecendo, de escândalos que estão surgindo, está obrigando que os bispos tenham que enfrentar da mesma forma como aconteceu em outros países, especialmente anglo-saxônicos. Eu sinto que aqui no Brasil estamos muito no início, mas têm muitos bispos, sacerdotes que os auxiliam, que estão trabalhando com muito empenho neste sentido. Não é muito fácil, porque eu vejo que a nossa cultura brasileira, latina, tem muita dificuldade no sentido de falar, de se abrir. E isso muitas vezes impede que esse processo seja enfrentado com objetividade. Também porque há carinho, respeito muito grande que nós, povo brasileiro, temos pelo clero, pela Igreja. Então um fato que infelizmente possa acontecer, ou aconteceu, de um abuso sexual por parte do clero, não se pode muitas vezes enfrentar porque não se quer falar. A vítima em geral não quer se expor. E isso muitas vezes dificulta ainda mais este processo.
Mas haverá uma cidade central no Brasil?
É um grupo, não é um lugar, de pessoas que vão dar este apoio. Agora, esta questão do lugar, todas as dioceses, todas as associações e congregações são e devem ser o lugar seguro onde as pessoas possam se manifestar. Por isso, é que está se criando esta mentalidade, através da formação e da educação, de como fazer para que as vítimas encontrem na própria Igreja a forma de poder se salvaguardar disso ou, se infelizmente aconteceu, de apresentar a denúncia. A estrutura que existe na Igreja e as orientações que estão sendo feitas, as formações, a educação, os seminários que estão sendo feitos são justamente para estruturar cada setor da Igreja para que entenda como fazer. As dioceses têm o tribunal eclesiástico, já existe a estrutura para que esta denúncia possa chegar. O que precisa acontecer é que cada ordinário, associação, cada superior de comunidade saiba o que deve ser feito. Aí, tem todo um processo para poder explicar, porque no Brasil ainda é algo novo que se está trabalhando, mas a estrutura já existe.